TJSP reconhece incidência de ITCMD sobre distribuição desproporcional de lucros sem justificativa negocial

A 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo reafirmou, em acórdão recente, que a distribuição desproporcional de lucros em sociedade limitada pode ser caracterizada como doação quando ausente justificativa negocial, atraindo a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

O caso envolveu uma sociedade empresária familiar na qual os genitores detinham 98% das cotas sociais. Em 2017, deliberou-se pela distribuição desproporcional de lucros acumulados — mais de R$ 53 milhões — dos quais cerca de R$ 48 milhões foram destinados aos filhos, que detinham apenas 2% das cotas e não exerciam funções de administração à época.

A Receita Estadual considerou que a operação consistiu, na prática, em uma doação simulada, e autuou os beneficiários com base no ITCMD, além de aplicar multa de 100%.

O TJSP reconheceu que a distribuição desproporcional de lucros é juridicamente válida desde que tenha propósito negocial legítimo, conforme artigo 1.007 do Código Civil. Entretanto, no caso concreto, entendeu que:

“Ausente razão negocial, e presente a liberalidade espontânea, assim considerado o animus donandi, a transferência do patrimônio caracteriza-se como doação.”

A Corte destacou que a mera previsão contratual de distribuição desproporcional não é suficiente para afastar o ITCMD, sendo necessário demonstrar vínculo com a lógica empresarial (como performance dos sócios, prospecção de negócios, aporte de know-how etc.).

A decisão enfatizou que o critério diferencial entre doação e distribuição desproporcional de lucros está na presença (ou ausência) do animus donandi, ou seja, o desejo de beneficiar o outro sem contrapartida econômica.

A jurisprudência administrativa da Fazenda paulista também caminha na mesma linha, como na resposta à consulta tributária nº 20952M1/2019, incorporada ao voto:

“A regular distribuição desproporcional de lucros não enseja a incidência do imposto sobre transmissão por doação, desde que justificada em razões de cunho negocial.”

O impetrante tentou afastar a tributação alegando que:

  • A distribuição constava do contrato social;
  • Os dividendos estavam lastreados em lucros efetivamente apurados;
  • O repasse visava compensar a atuação dos filhos como gestores da empresa.

Contudo, os elementos probatórios demonstraram, segundo a decisão, que os filhos só passaram a ser administradores após a distribuição e que não houve comprovação de prestação de serviços efetiva, nem de outra justificativa empresarial concreta.

A Corte também rejeitou o pedido de redução da multa tributária de 100%, entendendo que:

  • A sanção punitiva não ultrapassou os limites constitucionais;
  • O valor da multa está em conformidade com o artigo 38, II, “b”, do RICMS/SP;
  • Não há jurisprudência vinculante limitando, em casos semelhantes, o percentual de multa punitiva aplicável.

A decisão reforça a necessidade de planejamento societário bem fundamentado. Empresas que utilizam a distribuição desproporcional de lucros como instrumento de reorganização patrimonial precisam documentar a razão negocial do ato, sob pena de autuações fiscais relevantes.

  • Formalizar justificativas negociais (como desempenho, projetos captados, funções estratégicas);
  • Evitar distribuições desproporcionais a sócios inativos ou sem papel definido;
  • Incluir previsões claras em contrato social, mas acompanhadas de atas e documentos de suporte;
  • Avaliar impactos previdenciários e do IRPF em caso de requalificação como remuneração.

O precedente do TJSP reforça o entendimento de que não basta haver cláusula autorizativa de distribuição desproporcional — é imprescindível que haja propósito negocial comprovável, especialmente em empresas familiares, onde práticas informais são comuns. Do contrário, a distribuição poderá ser requalificada como doação tributável pelo ITCMD, sujeita inclusive a multas elevadas.

Assim, entendemos que a mensagem é clara: a autonomia privada deve ser exercida com responsabilidade e transparência, especialmente diante do olhar atento do Fisco.

Pode ser que faça sentido revisitar a estratégia e atualiza-la.  

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